Tacteio com dedos trémulos, com esta cegueira interior e remexo num emranhadao de chaves que abrem as minhas recordações.
Às vezes, sento-me ao lado delas, e, como amigas sérias de longa data, vemos passar a vida mesmo à nossa frente. Nada fazemos, ambas prostradas no caminho que não seguimos, nas experiências que não vivemos, nas emoções que não sentimos. Mas partilhamos, como amigas sérias, sem demonstrarmos o que sentimos, porque não o necessitamos, ambas sabemos que o sentimos sem que haja necessidade de palavras, de troca de olhares, porque a nossa cumplicidade reside nas imagens que partilhamos, sem que haja necessidade de comentar, sem que nos consigamos apoiar, convictas de que fazemos parte uma da outra, como amigas sérias que somos.
Outras vezes, sento-me à tua frente, igualmente prostrada, mas só, na mesma passividade. Vejo-te desfiar lembranças como contas de um rosário, e observo, comprazendo-me ou desfazendo-me em dolorosas lembranças. De mãos trémulas, olhos desfocados por uma névoa de saudade que dói. Vejo-vos, lembranças do que fui, fluir para longe, tão longe que só vos alcanço com o poder da mente. Vejo-vos fugirem-me por entre os olhos, desvanecerem-se e quase se apagarem. E fujo, fujo sem olhar para trás.
Em certas ocasiões, em que me sinto quase independente delas, limito-me a ignorá-las, deixando-as no meio da calçada de lugar nenhum. Sigo, ultrapasso-as, perante o seu espanto, e prossigo. Mas, aos poucos, desconheço-me, perco o que fui, vagueio no que sou e sinto que deixei parte de mim nessa calçada em que vos abandonei para sempre.
Recordações,
Não me deixem vaguear perdida e sozinha. Peguem-me na mão e caminhem comigo, estrada afora. Ajudem-me a reconhecer sempre as chaves de cada uma de vós. Sois o único elo que me prende ao que já não sou, ao que não voltarei a ser e ao que não voltarei a ter, mas preciso de vós para continuar a viver e a ver, com lucidez, o caminho a seguir rumo ao futuro…
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