sexta-feira, 30 de março de 2012

“Um caso de Amor” - Silvia Munhoz & PG- Quem Sou Eu? (Clipe Oficial)


    “Um caso de Amor”    
                                            Silvia Munhoz


Às voltas com problemas nunca solucionados, Lia resolveu sentar-se em frente ao computador, antes usado somente em trabalhos e pesquisas. Sem rumo ou objetivos maiores, pôs-se a navegar pelas salas de bate-papo.
Passou por várias delas, entrando e saindo logo em seguida. Não achava ninguém interessante para conversar, talvez por causa do seu estado de espírito, que, diga-se de passagem, estava uma bomba. Ou mesmo, porque não tinha o costume de ficar vagando pela “Internet”; mas precisava distrair-se, alegrar-se um pouco.
Em vias de desistir, espiou uma última sala. Entre muitos apelidos curiosos, “Homem Feliz” foi o único que conseguiu despertar-lhe interesse. Esse “nick” chamou sua atenção, provavelmente porque, em tese, contrariava os sentimentos de angústia e tristeza que a dominavam com freqüência. Decidiu descobrir o porquê do usuário tê-lo escolhido.
“Seria alguém realmente feliz? Teria motivos para sentir-se assimQual seria a receita?”. Foi com esse pensamento um tanto incrédulo que ela enviou uma mensagem.
Nos primeiros momentos, como em qualquer papo entre internautas, a conversa aconteceu chocha e sem graça. Pouco tempo depois, teclavam desenvoltos e alegres. Perceberam que havia entre eles uma certa identificação nos pensamentos e nas afinidades.
 Lia admirava-se das mensagens que retornavam cheias de vivacidade e lição de vida, fazendo crer que se tratava de um homem em paz consigo mesmo e com o mundo. Porém, alguma coisa lhe dizia que ele não era feliz, embora muito seguro de si e de suas idéias.
A maneira como Edy encarava as coisas deixou-a completamente intrigada. Sem contar que aquela simples companhia virtual lhe fizera um bem enorme. Ele havia conseguido colocar-lhe na alma uma pitadinha de felicidade. Nessa noite Lia desligou o computador com relutância.

O dia que se seguiu àquele encontro parecia interminável. A inexperiente internauta não parava de pensar na conversa que tivera e, na possibilidade de reencontrar o amigo “on line” novamente. Sem terem combinado nada anteriormente, ela sabia que seria quase impossível.  “Uma chance em um milhão!”- como se costumava dizer.
Sonhar não era proibido, era? Pois, então, Lia sonhou.
Mal anoiteceu, ela estava plantada na frente do “PC. Desejosa como uma criança em seu primeiro dia de aula. Quis estar cedo no “site”, tentando dar um empurrãozinho na sorte.
Foram uma espera e uma busca cansativas. Finalmente, lá estava ele.
“Achei!” – balbuciou ela, sorrindo.  O coração, fora de ritmo, batia acelerado. Lia, como sempre fora uma pessoa sensata e de pés no chão, se perguntou: “Por que tanta ansiedade? Que coisa mais boba!"                                                                                    
Voltou à realidade, se recompôs e fez o contato que tanto esperava. Usou um “nick” diferente. Não queria ser reconhecida de imediato. Precisava descobrir se ele fora sincero ao teclar. E, feliz da vida comprovou. Então, no momento apropriado, identificou-se como sendo a mesma pessoa da noite anterior. Quase não coube em si de alegria ao ser recebida calorosamente.

“Que sensação gostosa! Que sentimentos novos e estranhos!” – pensou.
Conversaram de tudo, riram muito e abriram seus corações. Confessaram coisas. Pareciam velhos amigos, conhecidos há tempos. Havia neles uma certa ternura implícita, reforçada pela confiança mútua e pelo carinho que sentiam.
 Foi  mais uma noite memorável para Lia, atrás da telinha do “PC”.
“Loucura! Devo estar ficando doida!” - se condenou, falando baixinho.
A partir do terceiro bate-papo, combinaram teclar através de um programa  restrito a um  pequeno grupo de amigos. Este permitia saber quando estavam “on line”. Isso facilitaria os próximos contatos. Não queriam perder tempo arriscando. Sentiam-se muito atraídos.
 Foram meses de encontros virtuais. A amizade crescia a cada um deles, dando sinais de que se transformava em algo intenso e envolvente, para estranheza de ambos.
Com o tempo, Lia acabou constatando que seu amigo não era tão feliz quanto dizia ser. Tinha lá suas diferenças, entretanto, procurava a todo custo não demonstrar.
Edy passava, às pessoas com quem teclava, a idéia clara de que a vida era feita de momentos felizes. Levantava o ânimo de qualquer um. Mas, lá no fundo, no íntimo da alma, tinha anseios sem respostas.
Talvez por esse motivo, pela alma em conflito, foi se deixando envolver pelas palavras da amiga. E, a cada novo encontro no “PC”, deleitavam-se com a sensação de que haviam achado suas almas gêmeas, embora não quisessem admitir tal absurdo.
Eles eram casados e tinham plena consciência de suas responsabilidades familiares. Experimentavam uma fase de muitos cuidados, decisões importantes e filhos na adolescência. Além do que, aquilo era uma fantasia, irreal, contatos virtuais, emoções virtuais.
 Isso existia? Se existia ou não, ainda não se sabia, mas a “Internet” estava cheia de corações apaixonados vagando por ela, que caíram nessa estranha malha chamada - “Amor Virtual”.
Acreditando ou não, estranhando ou não, estavam presos como muitos outros. Porém, entre eles aconteceu o inesperado. Era fato que quando jovens, talvez até como quase todos os adolescentes, escreviam versos, arriscavam temas. Todavia, sem darem o valor devido, abandonaram as rimas. Agora, sentiam ressurgir quase que incontrolável todo aquele ímpeto da adolescência - emoções fortes e arrebatadoras. Isso fez com que voltassem a escrever, trocando versos e opiniões a respeito dos trabalhos. Foram muitos, iam e vinham pela “Internet”, levando seus corações neles.
 Por vezes declararam-se, escondidos atrás dos poemas. Parecia loucura, tudo virtual, bem longe do real. Viviam momentos felizes, mas de um modo totalmente diferente do normal e não conseguiam entender bem aquilo.
Resolveram então, aceitar sem questionar, apenas sentir, e o fizeram. Viveram plenamente muitos encontros virtuais e eram felizes assim. Porém, como nada é perfeito, nada dura para sempre, as famílias perceberam diferenças de comportamento e começaram pressionar da maneira que conseguiam.
Os encontros pela “Internet” ficaram difíceis e raros, muitas vezes tensos pelo efeito do controle que lhes impunham. Tudo se complicava. Pelo sim, pelo não, impelidos pela moral e os bons costumes nos quais foram rigidamente criados, decidiram que o melhor e mais indicado seria terminarem esse relacionamento.
Diante da injustiça de verem anulados seus sentimentos, favorecendo pessoas poucas vezes sensíveis, optaram por perpetuar o que sentiram um pelo outro enquanto puderam teclar. E assim, tendo colocado “on line” todos os poemas que fizeram, num bem montado “site”, despediram-se definitivamente.
Destinados a tornarem-se mais um dos desencontros da vida, viram  com muita tristeza, seus corações partirem soltos pela “Internet”, num mundo totalmente novo e virtual, enquanto seus corpos permaneciam presos aos velhos padrões morais do mundo real.




                                                 PG- Quem Sou Eu? (Clipe Oficial)



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